Um móvel e uma história

Conheci meu marido no fim dos anos 80. Na época ele havia terminado o curso de marcenaria pelo Senai e exercia a profissão. Nos casamos 5 anos depois e trouxemos pra nossa casa, com muito orgulho, dois móveis feitos por ele na época do curso: a sapateira da foto e uma estante, daquelas de colocar TV popozuda de 20 polegadas.

Poucos meses depois de casados, meu marido, então bancário, foi fazer um curso de dois dias fora da cidade. Ele ficou num hotel o que permitiu que eu – artista e mente inquieta desde sempre – tivesse tempo de incrementar a sapateira.

Pintei as molduras com cores nada discretas: vinho e verde e, nas portas, usei uma técnica de pintura que era moda na época, o bauernmalerei.


 Eu não sei ao certo porque mas eu não havia contato ao meu marido sobre a arte. Quando ele chegou em casa, eu fui mostrar meu feito com um misto de orgulho, ansiedade e medo e ele falou, ou melhor, gritou “O QUE VOCÊ FEZ”??? Não deu tempo do meu cérebro processar a expressão dele depois, dizendo que era uma brincadeira, e eu desatei a chorar. Ele me abraçou, me deu beijinhos, pediu desculpas, disse que era brincadeira e ficou tudo bem.

Quase 20 anos depois, o móvel ainda nos acompanha. Sobre ele você pode ver uma pincelada de todos nós: café, que nós amamos, quadro pintado por nossa filha quando tinha uns 7 anos, o menu que fazemos semanalmente para facilitar as compras e organizar a nossa vida corridinha, minha escultura em papel machê e, ao fundo, telha pintada por nosso filho com então 4 anos. Reparou que é o Congresso Nacional? :)

Pra fechar, uma revelação bombástica. Ano passado... ah, olha só, no feriado de carnaval... meu marido quis exercitar suas habilidades de marcenaria e fez uma cama em MDF para o Lucas, nosso filhote. Cama simples não, daquelas com escada, escorregador e tudo. Cama terminada, eu, toda empolgada, fazia planos de como decorá-la: três cores alegres mais aplicação de tecido... então ele me confessou a verdade: ele não gosta de móveis pintados. (pausa pra eu respirar fundo e processar novamente a informação). 

Pois é, pois é... convivemos por anos com o armário da cozinha que era meu guarda-roupa de solteira repaginado e patinado... tantos móveis, tantas histórias. E ele guarda este segredo por tantos anos. Enfim. Não me conformo porque eu acho o máximo repaginar um móvel antigo com cores vivas. Por outro lado imagino o “sofrimento” dele guardando este segredo por tanto tempo, pra não me chatear. Coisas da vida.

Voltando à peça, não tem muito segredo: lixa, pintura com tinta acrílica e verniz fosco por cima. Os puxadores e o respiro eu pintei com uma mistura de verniz com purpurina.

Gostou da nossa sapateira? E da nossa história?

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